segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Sobre as funções do Mestre da Ordem do Templo.

Estas funções eram aplicadas ao Mestre da Casa-mãe, em Jerusalém, a principal Casa que a Ordem possuía, dela emanando todas as directrizes e nomeações [as que indigitava e as que, já concretizadas, dava normalmente o seu aval] para as restantes Províncias — cujos Mestres, no seu geral, aplicavam e tomavam com veneração e respeito, seguindo-as escrupulosamente.

O Mestre.

(…) O Mestre tem o báculo para sustentar os fracos, e a vara, para castigar os delitos — «Magister, qui baculum, e virgam manu tenere debet; baculum videlicet, quo aliorum virilium imbecilitates sustentet; virgam quoque, qua vitia delinquentium zelo rectitudinis feriat»1. Este poder de castigar será exercido em obediência ao Patriarca, e segundo o parecer deste. A Regra invoca o ensinamento de S. Máximo, para que nem a brandura relaxe o justo rigor, nem a aspereza desespere os delinquentes.
Se algum cavaleiro comete pecado, venial ou mortal que seja, o Mestre tem o privilégio de tomar disso conhecimento pela boca do próprio infractor, proferindo a sentença correctiva apropriada. Ou leve penitência, se o caso não for grave, ou castigo maior, se a pena for grave ou, ainda pior, se a falta chegou ao conhecimento do Mestre, não pela palavra do infractor, mas através de outro freire.2 Assim como tem o poder de admitir, tem o poder de expulsar e de separar. Se algum freire comete falta muito grave, o Mestre separa-o da comunidade e em tudo fica sujeito à disposição do Mestre.
O poder do Mestre, sem atingir as raias do discricionário, abrange o direito de dar armas e cavalos, e tudo o mais, a quem lhe parecer.3 Neste aspecto ele decide sózinho.
O Mestre preside aos Capítulos, tanto ao secreto como ao geral. O Capítulo reúne, ou toda a comunidade, ou apenas o Mestre e os conselheiros, para estudo de problemas e adequada decisão. Apesar de possuir, por escolha electiva, o báculo e a vara, símbolos do poder de governar e de ensinar, o Mestre ouve o Conselho, por lhe ser necessário ouvir e escutar quem saiba mais acerca da paz e da guerra, ou da forma de proceder adequada nesta ou em estoutra situação. O Mestre chamará ao Conselho, ou Junta (Consilium) aqueles frades que lhe parecerem de maior juízo e prudência. Se houver de decidir sobre questões maiores, ele ouvirá toda a congregação. Ouvirá, mas, tendo ouvido, o Mestre decide o que julgar melhor4.
O Mestre aplica a Regra, mas sempre há casos a considerar. São aqueles que a Regra não contempla de forma casuística, e que melhor devem constar das posteriores e necessárias Constituições. Por isso, o Mestre dispõe de poderes para julgar as excepções, os casos particulares, e determinar o procedimento em cada caso. Sabido o que se deve dar aos capelães, o Mestre decide, por «sua graciosa vontade») «Magistri sponte»)5 o que poderá dar a mais. Ele pode também alterar a ordem das orações matinais a cumprir pelos frades achacados, que dispensará do dever, caso o entenda justo. O mesmo poder se aplica ao número de cavalos a possuir por cada soldado. Se forem necessários mais de três, o Mestre dará, ou não, a respectiva licença.6 Quanto à liberdade de os cavaleiros saírem do Templo em passeio pela cidade, salvo em visita ao Santo Sepulcro, só o Mestre pode conceder licença e, por outro lado só ao Mestre incumbe o direito de autorizar que um cavaleiro saia sozinho do convento7. Neste particular, cada um deve sujeitar-se, sem constrangimento, ao que o Mestre lhe ordenar8. Idêntico poder lhe inere acerca dos arreios luxuosos, detendo ainda o poder de ouvir ler as cartas que os religiosos recebam de seus familiares, ou de qualquer outra pessoa. A leitura das cartas é devida, mas o Mestre tem o poder de dispensar o freire dessa leitura, se ele quiser, «si ei placit»9. O Mestre está isento desta obrigação de ler as cartas que recebe. Ele e o Procurador da casa têm isenção desse dever. Por fim, quanto à admissão de soldados seculares, e mediante o processo determinado pelo artigo 58.º da regra, pertence-lhe o arbítrio sobre o tempo de provação a conceder ao candidato e a sua posterior admissão. O Mestre é um abade, um pai, o primeiro responsável pelo exercício da Regra
.
[Pinharanda Gomes, A Regra Primitiva dos Cavaleiros Templários, pp. 25-27, Hugin, Lisboa, 1999.]

Notas:
1 Regula, art. 68.
2. id., art. 67.
3. id., art. 39.
4. id, art. 59.
5. id, art. 4.
6. id., art. 30.
7. id., art. 34.
8. id., art. 35.
9. id., art. 41.

Aqui podemos notar que se fala de Mestre e nunca de grão-mestre, título ou coisa inventada em tempos mais ou menos recentes — séculos XVII-XVIII — e que na Ordem do Templo — aquela de que aqui falamos, por ser a verdadeira e a única! — nunca teve existência, por nunca ter tido, ou usado, este nome, tornado deveras enigmático e ridículo pelo oportunismo da colagem, próprio, aliás, dos diabólicos e fantasmagóricos seres humanos que a inventaram. Apenas Bailío, Procurador e Mestre se lhes aplicara na verdade. Nunca este ridículo termo de grão-mestre, espécie de título de pavoneio e manta de muitos remendos, fora usado pelos Templários: quer no Outremer quer em qualquer das suas Províncias espalhadas por vários reinos europeus.

Deixo, assim e desta forma, mais alguns elementos de conhecimento que nos serão bastante úteis para a aprendizagem que desejamos possuir.

Até breve.

Sem comentários: