Mouros preparados para o combate
Assim, rapidamente contada ou descrita, tenha-se noção — muito ligeira — da acção do contingente português enviado pelo monarca Afonso II, ao rei Afonso VIII de Castela, tanto quanto o seu papel no desenrolar da refrega. Que existiu esta presença, apesar de não muito numerosa, e dos manuais publicados pelos estudiosos estrangeiros da batalha — espanhóis e outros — muito raramente o referirem, não podem haver omissões deste género, porque são crassas e selectivas, já para não dizer impróprias de quem realmente estuda e publica o que investiga. Vejamos o que nos diz o nosso narrador:
Em 1212 expirava a trégua de um lustro que o rei de Castela tivera de negociar com o almohada, ao tempo da batalha de Alarcos. Belicoso e decidido a exterminar o poderio muçulmano, Afonso VIII não temia a empresa, não obstante saber considerável a organização guerreira do sarraceno e inextinguível o material humano que ele podia transportar do Magreb com o auxílio da sua numerosa esquadra. Havia a ponderar, contudo, as dissenções entre os reinos cristãos e, especialmente, as manobras dúbias a que se entregava o rei de Leão, hostil a Portugal e feito com o miramolim.
De qualquer forma, o de Castela entendia vingar o desastre de Alarcos. Então, subitamente inspirado, envia mensageiros aos príncipes cristãos da península e de além Pirinéus, conseguindo que o papa acordasse ao movimento a feição de Cruzada. E seguro do concurso universal, mais uma vez Afonso VIII desafia o almohada, Mohamed Anasir, que reúne, a seu turno, forças consideráveis que já tinha no Andaluz e manda pregar a guerra santa até aos recônditos confins do seu império africano.
Logo que as tropas aliadas da Península e as legiões estrangeiras fizeram concentração, é ordenado o avanço. E apesar da resistência e dos obstáculos que os sarracenos opuseram, os cristãos entram vitoriosamente em Calatrava. Era um bom triunfo. Os estrangeiros, porém, como tantas vezes aconteceu em liças de cruzados, abandonaram o campo sob pretexto de não poderem suportar o calor. Não houve súplicas bastante eloquentes para os demover, nem lhes importou a ameaça que para a cristandade representava a circunstância de se ter provocado o exército muçulmano e não mostrar coesão para o enfrentar. Ficou assim reservado o choque brutal às forças peninsulares — mas também lhes coube, sem partilha, o que Menéndez y Pelayo entende ser «a maior vitória lograda pela cristandade após a de Carlos Martel em poitiers».
Essa vitória foi a de Navas de Tolosa, obtida em 16 de Julho de 1212, após quatro diasa de soalheira abrasadora, durante os quais nem uma ligeira brisa agita o estandarte de Cristo e o fanal do Islão. Dela comparticiparam os portugueses, que se fizeram notar pela bravura na peleja e coragem para suportar os rudes sofrimentos da canícula e privações. Do que foi o resultado, a princípio duvidoso tal a esmagadora potência do exército muçulmano, diz bem o epíteto de que se servem os cronistas agarenos ao referir a tremenda batalha: a da desventura. O desbarato foi completo. Mohamed Anasir teve de romper caminho entre montões de cadáveres, para fugir numa égua veloz que lhe emprestou um dedicado servidor, encontrando ainda um grupo de negros que lhe auxiliou a retirada. E enquanto os cristãos prosseguem triunfantes na reconquista, o almohada regressa a Marrocos, entrega as rédeas do Estado ao filho e procura na embriaguez alíviopara o sofrimento moral, até que o envenenam e morre. [Eduardo Dias, Árabes e Muçulmanos, Tomo II, A invasão da Hispânia e o aspecto cultural do Islamismo, pp. 138-140, Livraria Clássica Editora, Lisboa, 1940.]
Em 1212 expirava a trégua de um lustro que o rei de Castela tivera de negociar com o almohada, ao tempo da batalha de Alarcos. Belicoso e decidido a exterminar o poderio muçulmano, Afonso VIII não temia a empresa, não obstante saber considerável a organização guerreira do sarraceno e inextinguível o material humano que ele podia transportar do Magreb com o auxílio da sua numerosa esquadra. Havia a ponderar, contudo, as dissenções entre os reinos cristãos e, especialmente, as manobras dúbias a que se entregava o rei de Leão, hostil a Portugal e feito com o miramolim.
De qualquer forma, o de Castela entendia vingar o desastre de Alarcos. Então, subitamente inspirado, envia mensageiros aos príncipes cristãos da península e de além Pirinéus, conseguindo que o papa acordasse ao movimento a feição de Cruzada. E seguro do concurso universal, mais uma vez Afonso VIII desafia o almohada, Mohamed Anasir, que reúne, a seu turno, forças consideráveis que já tinha no Andaluz e manda pregar a guerra santa até aos recônditos confins do seu império africano.
Logo que as tropas aliadas da Península e as legiões estrangeiras fizeram concentração, é ordenado o avanço. E apesar da resistência e dos obstáculos que os sarracenos opuseram, os cristãos entram vitoriosamente em Calatrava. Era um bom triunfo. Os estrangeiros, porém, como tantas vezes aconteceu em liças de cruzados, abandonaram o campo sob pretexto de não poderem suportar o calor. Não houve súplicas bastante eloquentes para os demover, nem lhes importou a ameaça que para a cristandade representava a circunstância de se ter provocado o exército muçulmano e não mostrar coesão para o enfrentar. Ficou assim reservado o choque brutal às forças peninsulares — mas também lhes coube, sem partilha, o que Menéndez y Pelayo entende ser «a maior vitória lograda pela cristandade após a de Carlos Martel em poitiers».
Essa vitória foi a de Navas de Tolosa, obtida em 16 de Julho de 1212, após quatro diasa de soalheira abrasadora, durante os quais nem uma ligeira brisa agita o estandarte de Cristo e o fanal do Islão. Dela comparticiparam os portugueses, que se fizeram notar pela bravura na peleja e coragem para suportar os rudes sofrimentos da canícula e privações. Do que foi o resultado, a princípio duvidoso tal a esmagadora potência do exército muçulmano, diz bem o epíteto de que se servem os cronistas agarenos ao referir a tremenda batalha: a da desventura. O desbarato foi completo. Mohamed Anasir teve de romper caminho entre montões de cadáveres, para fugir numa égua veloz que lhe emprestou um dedicado servidor, encontrando ainda um grupo de negros que lhe auxiliou a retirada. E enquanto os cristãos prosseguem triunfantes na reconquista, o almohada regressa a Marrocos, entrega as rédeas do Estado ao filho e procura na embriaguez alíviopara o sofrimento moral, até que o envenenam e morre. [Eduardo Dias, Árabes e Muçulmanos, Tomo II, A invasão da Hispânia e o aspecto cultural do Islamismo, pp. 138-140, Livraria Clássica Editora, Lisboa, 1940.]
Até breve.
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